Muitas pessoas acham – erroneâmente – que o Projeto de Arquitetura se limita ao Edifício como objeto construído. Outras acham que Arquitetura é uma coisa e Urbanismo outra e que essas disciplinas são pensadas de maneira independente.
No Brasil, o profissional se forma Arquiteto e Urbanista – o que engloba uma série de atribuições profissionais que são regulamentadas pela Lei Federal 12.378 (31/12/2010) e posteriormente pela Resolução CAU 51 (12/07/2013).
Dentre as atribuições do Arquiteto Urbanista (AU) está o Projeto de Arquitetura Paisagística.
Como o nome sugere, o Paisagismo faz parte da Arquitetura uma vez que ele compõe, em conjunto com o Projeto da Edificação, o conceito e partido do Arquiteto para aquele projeto específico. O paisagismo reforça fluxos, circulações, cria sensações e espaços, delimita e reforça acessos, cria um sentido de lugar – espaços de permanência, de lazer, passagem, etc.
O Paisagismo, desta forma, não se limita a Vegetação: ele define tipos de pisos (seja pela capacidade de drenagem – permeáveis, semi-permeáveis impermeáveis – seja pelas características de durabilidade, cores, materiais – pedra, madeira, água, vegetação -, sensação/tato, etc.), fechamentos (muros, gradis, muretas, alambrados, bancos, etc), iluminação (de piso, suspensa, de parede, posteada, etc. ), mobiliário (fixos e móveis), coberturas (pergolados, tetos retráteis, marquises, etc.), espelhos dágua, piscinas, lagos, tanques de retenção de águas pluviais e, inclusive, a Vegetação propriamente dita.
A Vegetação costuma ser – principalmente para o leigo – a principal forma de se fazer Paisagismo. Sua importância é inegável, principalmente em áreas externas (paisagismo de exteriores) quando sua função vai além das questões estéticas e conceituais, mas ajuda na melhoria da qualidade urbana como um todo – seja pela sua contribuição no ecossistema/fotossíntese, seja pela capacidade da vegetação em ajudar na drenagem e recomposição de lençóis freáticos.
Tendo em vista estas características importantes, existem dois aspectos de legislação urbanística que precisam ser observados logo no início de qualquer projeto: a Taxa de Permeabilidade e, no Município de São Paulo, a Quota Ambiental (Artigo 74 da Lei de Zoneamento).
A Taxa de Permeabilidade (TP) se refere a um percentual do Lote a ser destinado à áreas que contribuam para o sistema de drenagem urbano: um terreno permeável absorve as águas provenientes de chuvas e as direcionam ao lençol freático. No Município de São Paulo, a partir do novo Plano Diretor (2014) e Zoneamento (2016), a maioria dos lotes possui TP = 25%. Em termos práticos: um lote de 1.000 m2 precisa destinar 250 m2 à área permeável.

Para ser permeável, a área destinada a cumprir a Taxa de Permeabilidade tem que estar localizada no nível do solo e estar diretamente conectada ao terreno, sobre solo natural – desta forma, não é possível dar uso às áreas que se localizem sob sua projeção, como subsolos, por exemplo. Em geral, costuma-se destinar à jardins, com vegetação. É possível compor a metragem quadrada destinada à área permeável com áreas que sejam semi’permeáveis, conforme veremos a frente.
A Quota Ambiental (QA) é obrigatória para lotes com mais de 500 m2. A Quota Ambiental se refere a uma pontuação mínima que deve ser atingida pelo projeto. Esta pontuação é atribuída a elementos que constam no projeto, como porte da arborização adotada (pequena, média ou grande), soluções de retenção de águas pluviais (reservatório de retardo), paredes e tetos verdes, etc.

A fórmula para o cálculo da QA é:

O primeiro passo para o cálculo é localizar – através do GeoSampa ou do próprio Zoneamento, no Mapa 3- qual o Perímetro de Qualificação Ambiental em que o lote está inserido.

Neste exemplo, o lote se localiza em um PA-2.
A seguir, no Quadro 3A do Zoneamento, localizar as características a serem seguidas para o perímetro considerado (no caso, o PA 2):

Considerando um terreno cujo lote tenha 3000 m2, temos uma Taxa de Permeabilidade = 25% e uma pontuação de Quota Ambiental = 0,64. Os fatores alfa e beta são iguais a 0,5. Teremos então a seguinte composição de Quota Ambiental (QA):

Os valores de V e D precisam ser atribuídos pelas tabelas constantes do Quadro 3b do zoneamento (acesse aqui).
Para auxiliar nestas contas complexas, a Prefeitura disponibiliza um arquivo Excell que ajuda nos cálculos e pode ser baixado aqui (SIMULADOR DE QUOTA AMBIENTAL). A imagem abaixo é deste Excel preenchido com os dados que estamos considerando neste exemplo.

No item II da Tabela, preenchemos com os dados de projeto relativos a Vegetação, conforme imagem abaixo:

Observe que estamos considerando que o projeto tem as seguintes características:
- 500 m2 de área ajardinada sobre solo natural
- 250m2 de pavimento semi-permeável com vegetação sobre solo natural
- 20 árvores a serem plantadas de Pequeno porte
- 10 árvores a serem plantadas de Médio porte
- 5 árvores a serem plantadas de Grande porte
- 10 palmeiras a serem plantadas
- o terreno não possui nenhum indivíduo arbóreo existente nem maciços arbóreos
- consideramos cobertura verde com substrato superior a 40cm, totalizando 300m2
- temos paredes verdes que totalizam 200m2
Com esses dados de Projeto conseguimos alcançar um valor de V = 1,30.
A seguir, no item III da Tabela, preenchemos com os dados de projeto relativos a Drenagem, conforme imagem abaixo:

A Tabela Drenagem já puxa os dados da Tabela de Vegetação inseridos anteriormente.
Estamos considerando, nesta tabela, que:
- adotamos 250m2 de pavimento semi-permeável sem vegetação
- automaticamente a tabela nos informa que temos 1700m2 de áreas impermeáveis
- o volume mínimo de reservação (dado automaticamente pela tabela) é 18.900 m3
- adotamos um reservatório de reservação de 25.000 m3
Com esses dados de Projeto conseguimos alcançar um valor de D = 0,34 e uma QA = 0,66 (nosso mínimo era 0,64).
O importante é ter em mente o seguinte: só conseguimos preencher a Tabela de Quota Ambiental se tivermos o Projeto Paisagístico DEFINIDO: quantos indivíduos arbóreos, seu porte (pequeno, médio ou grande), tipos de piso (permeável, semi-permeável, não permeável).
Neste exemplo, o mínimo de área destinada a atender a Taxa de Permeabilidade seria de 750m2 (25% de um terreno de 3.000m2) a princípio, porém só conseguimos atingir o valor de QA com uma área permeável de 500m2 associada a áreas semipermeáveis (500 m2, sendo metade com vegetação e metade sem vegetação), cobertura verde (300m2), contabilizando 1300m2 de Cobertura Vegetal. A área não edificada, no pavimento térreo, seria de 1000m2 e não os 750m2 inicialmente imaginados.
O projeto deste exemplo é constituído, portanto, de 1.700 m2 de áreas impermeáveis e 1.300m2 de áreas permeáveis e semi-permeáveis – dos quais 1000 m2 estão no pavimento térreo e 300m2 na cobertura, através de tetos verdes. Contribuíram para a pontuação da QA paredes verdes e o número de indivíduos arbóreos a serem plantados.
No próximo texto, traremos algumas referências sobre escolha de espécies vegetais adequadas à Arborização Urbana.
As imagens que ilustram este texto foram retiradas do Zoneamento Ilustrado, que você pode baixar aqui.
OBSERVAÇÕES:
Todo lote com mais de 500 m2 e que tenha que atender a QA é obrigado a atender ao reservatório de controle de escoamento de águas superficiais com o volume mínimo estabelecido pelo quadro 3B do Zoneamento: este Volume tem que ser – obrigatoriamente – no mínimo igual a (6,3 litros) x (área do lote). Ou seja, para um lote de 1000m2 o volume deste reservatório é de no mínimo 6.300 m3.
Imóveis localizados na Operação Urbana Centro e com TO de 0,7 ficam dispensados de atender a QA (Artigo 6, parágrafo 3 do Zoneamento) mas são obrigados a atender ao reservatório de controle de escoamento de águas superficiais.
Em lotes com mais de 500 m2 e que não estejam em ZEPAM e ZPDS a TP pode ser diminuída em 50% caso a QA seja aumentada em 50% – o que constitui uma boa solução em terrenos cuja área destinada a TP seja excessivamente grande e prejudique a solução de projeto da edificação.
Em terrenos de até 5.000 m2, quando e empreendimento atingir de 2 a 4 vezes o mínimo estabelecido para a QA, este empreendimento pode receber benefício de área computável, de acordo com fórmula estabelecida no parágrafo 3 do artigo 82 do Zoneamento.
É Imprescindível a leitura e entendimento do texto COMPLETO do Zoneamento e decretos posteriores para total atendimento à Legislação.
Estas informações são direcionadas a projetos acadêmicos – para projetos “da vida real” é indispensável a contratação de um Arquiteto para a verificação das necessidades de seu projeto e adequações a legislação de sua municipalidade.
© Marcelo Sbarra
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