Para quem faz um EVTL pela primeira vez pode parecer muita informação, mas com o tempo e a prática (é um “jogo” de tentativa e erro e uma tabela de Excel, na prática) o pensamento sobre a construção da lâmina do pavimento tipo é condicionada por uma série de fatores.
Um deles, a escada, vimos no post anterior (aqui). A posição dela ajuda a configurar o Pavimento Tipo e é fundamental entender o que acontece no Térreo e Estacionamentos.
Vamos lembrar que estamos fazendo o seguinte programa de necessidades:
“Edificação de Uso Misto (R e nR), com Benefício Fachada Ativa e Benefício Incentivo nR (ou nR Incentivado ou Benefício 20%), em ZEU“
Como Estratégia de Projeto, devido ao terreno que eu tenho ser estreito, vou usar os primeiros pavimentos (até o limite de 36m de altura) para nR e os demais pavimentos para R, sem ultrapassar 80m de altura. Por que?
Nos posts anteriores vimos que:
- nR com mais de 36m de altura precisa de 2 escadas (LPUOS e COE) e;
- R com mais de 80m de altura precisa de 2 escadas e elevador de emergência (IT-11);
Sendo assim, utilizando a estratégia projetual acima, eu preciso de 1 núcleo rígido para o nR e 1 núcleo rígido para o R, independentes.
Relembrando que o meu terreno é estreito, a solução mais adequada é o pavimento em lâmina (ou retangular) com o núcleo rígido (escada + elevadores) no centro do pavimento.
Utilizando o corte que já estamos usando no desenvolver destes posts, a situação do núcleo rígido ficaria como marcado em roxo abaixo:

Lembrando que é um corte esquemático, temos que considerar que:
O usuário que for para os pavimentos R, acessa o empreendimento pelo pavimento Térreo e acessa elevadores e escadas. O elevador só vai parar nos pavimentos R e a escada ficará lacrada nos pavimentos nR.
Já o usuário que vai para os pavimentos nR, também acesso o empreendimento pelo Térreo e acessa elevadores e escadas. O núcleo rígido para no último pavimento nR e não continua até os pavimentos R.
Surge uma questão técnica a ser resolvida: o elevador nR precisa de uma altura de última parada em torno de 4,50m (mesmo considerando que seja sem Casa de Máquinas, é necessário o espaço para as roldanas/polias). Isso significa que: no primeiro pavimento R, no local onde ficava o Núcleo Rígido, será uma Área Técnica (não computável). Nos demais pavimentos R, pode-se incluir uma Unidade Habitacional neste espaço.
Atualizando o nosso corte esquemático, em cinza está indicada a posição da Casa de Máquinas nR, no primeiro pavimento R. O acesso à ela deve ser feito pelo pavimento nR, por alçapão no teto da circulação horizontal, preferencialmente, de forma a não se comunicar com a parte R.

Isso significa, em termos mais práticos, que uma boa solução para a localização dos núcleos rígidos seria um de frente ao outro. Como eles nunca abrirão no mesmo pavimento (exceto no Térreo, que é o pavimento de fuga no nosso exemplo), estaremos atendendo a distância mínima de 10m entre 2 portas de escada de incêndio que abrem em um mesmo pavimento (à exceção do Térreo, por ser pavimento de fuga) da IT-11 dos Bombeiros.
Seria uma solução assim (lembre que é apenas ilustrativo, pois as portas de um lado nunca estarão abertas quando as portas do outro lado estiverem).

E como eu cheguei nesta modulação estrutural? Pela boa prática, em subsolos, em um EVTL, consideramos 1 pilar a cada 3 vagas:

Novamente lembrando ser apenas uma primeira tentativa e que as portas de uma das escadas estaria lacrada, assim como os elevadores desta escada, garantindo que somente usuários R (ou nR) acessem este pavimento de garagem.
Como no post anterior já sabemos como fica a escada no Térreo, teríamos a seguinte configuração:

Percebam que as escadas e elevadores R e nR estão completamente separados por alvenaria e garantem um círculo de 1,50m de circulação em frente ao Hall de elevadores.
O térreo R está representado pela mancha azul, lembrando que o Térreo R é totalmente não computável.
Já o térreo nR é computável, à exceção do núcleo rígido (circulação vertical, vide COE explicado no post anterior) e está representado pela mancha laranja.
A Fachada Ativa tem que ser conectada diretamente pela rua, então, separei um espaço em frente ao acesso nR e ao lado do acesso R. Dando um zoom na imagem você perceberá uma cota de 35,45m relativas a testada do lote. A Fachada ativa precisa ocupar, no mínimo 25% da testada, ou seja, 8,86m no mínimo – por isso fiz ela maior que a projeção da Torre.
Note que fiz também uma portaria para o nR fora da projeção da Torre. Também contará para a TO, assim como a maior projeção da Torre. Já a Portaria R deixei embaixo da projeção da Torre.
Note a rampa de veículos ao lado esquerdo do desenho (largura = 5,50m para mão e contra-mão). Perceba que já deixei, nos fundos do terreno, espaço sudifiente para a minha área permeável (considerando a diminuição de 50% via Quota Ambiental)
1º SUBSOLO

A escolha da posição da Torre não foi ao acaso. Já sabendo que teria que resolver o subsolo, tenho que ter em mente:
- a largura para a passagem de 2 carros é 5,50m (COE);
- a largura para a passagem de um carro é 2,75m, mas como a área de manobra para um carro sair de frente é 5,00m, adotamos 5,00m se o percurso atender até 60 vagas, senão temos que adotar 5,50m;
- a rampa de veículos tem 20% de inclinação, o que me possibilita saber qual o comprimento que ela ocupa em planta (para piso a piso 3,60m, ela ocupa 18,00m , por exemplo);
- preciso de áreas técnicas, destacadas em cinza escuro (junto a escada, a Casa de Máquinas de Pressurização da escada, por exemplo), Área de Apoio para Funcionários (em azul) e circulação de pedestres, em roxo (corresponendo a área da escada e o hall) – todas elas não computáveis. No caso do 1º subsolo, como a escada não abre, podemos considerá-la um vazio (ou seja, área zero).
Neste subsolo coloquei 52 vagas em 1.303,07m² de área de circulação e manobra, o que me dá uma cota de garagem de 25,05m² (ótima, pois o máximo é 32m²/vaga).
2º SUBSOLO
É o mesmo raciocínio do primeiro subsolo. A diferença é que a escada e elevadores nR já não “existem” mais, ou seja, o espaço onde elas ficavam é ocupado pelo poço de molas dos elevadores e área técnica embaixo da escada (que pode ser acessso a reservatório inferior, por exemplo). Total de 52 vagas em 1.303,07m² de área de circulação e manobra

3º SUBSOLO
É igual ao 2º subsolo, com a diferença que a rampa só sobe, ou seja, consigo espaço para colocar mais vagas e aumentar um pouco a Área Técnica. Fiquei com 55 vagas em 1.425,36m². Somando o 2º e 3º subsolos (R), tenho 52 + 55 = 107 vagas em 2.728,43m², o que me dá uma cota de garagem de 25,50m² (ótima)

PAVIMENTO TIPO nR (1º ao 9º PAVIMENTOS)
As unidades nR (que podem ser escritórios, por exemplo, mas NÃO podem mais ser flats) estão destacadas em laranja. São computáveis e somam 369,15m² por pavimento.
Os terraços das unidades, em cor ocre, não computáveis, somam 85,77m² (não computáveis e com limite de 85,87m², ou seja, praticamente usei o potencial todo de terraço nestes pavimentos)
A circulação horizontal, em roxo, 50,11m², computável.
A circulação vertical em roxo, 22,80m², não computável.
Em cinza escuro, àrea técnica com 16,19m², não computável.
Ao verificar a Tabela Numérica preenchida, vocês perceberão que eu utilizei o Benefício nR Incentivado nos 3 últimos pavimentos nR (7º, 8º e 9º). Além disso, como a computável estava estourando um pouco e eu tinha saldo de Benefício nR, utilizei no 6º pavimento 50,11m² de Benefício nR para cobrir a circulação horizontal que seria computável.

10º PAVIMENTO – R
Como comentei antes, neste primeiro pavimento R temos que ter uma Casa de Máquinas para os elevadores nR. Além disso, estou utilizando parte desta área técnica para colocar as condensadoras de ar condicionado das Unidades R deste pavimento. Observe que a área de terraço será um pouco diferente dos demais pavimentos, uma vez que neles a Área Técnica vai virar Unidade e com isso terá terraço também.
Área das unidades (computável) = 368,73m²
Terraço (não computável) = 85,73m²
Área técnica (não computável) = 47,20m²
Circulação horizontal (computável) = 46,30m²
Circulação vertical (computável) = 26,61 m²

11º PAVIMENTO ao – 19º PAVIMENTOS – R
As mudanças são sutis. Onde havia Área Técnica, ganho uma nova Unidade Residencial. Com isso, precisei redistribuir as áreas de terraços entre as unidades. Para não ficar um “vazio” onde precisei diminuir, utilizei para Área Técnica da própria unidade, para colocação das condensadoras de ar condicionado.
Área das unidades (computável) = 404,08m²
Terraço (não computável) = 85,75m²
Área técnica (não computável) = 13,55m²
Circulação horizontal (computável) = 46,30m²
Circulação vertical (computável) = 26,61 m²

ÁTICO
Para o Ático, estou prevendo uma Área Técnica sobre as escadas, em torno de 200m², não computável.
TABELA NUMÉRICA
O resumo numérico se encontra abaixo. Percebam que a própria tabela é como se fosse um corte do projeto: Térreo, abaixo dele os subsolos e acima os pavimentos na ordem que ocorrem.
Percebam que os valores “0,00” nos 7º ao 8º nR que existem pois são pavimentos nR iguais aos demais abaixo, tiveram a sua área considerada nas colunas de Benefício nR / nR Incentivado. No 6º pavimento nR, os 50,11m² que estavam estourando do CA de 7.200m², considerei como Benefício nR também, ainda sobrando 47,05m² de Benefício (que no mundo real esgotaríamos em algum lugar!).
Minha área construída total ficou em 14.407,84m², sendo composta por 7.200,00m² de área computável e 7.207,84m² de área não computável (não se inclui a Fachada Ativa nem o Benefício nR Incentivado).
Minha privativa/terreno ficou em 0,62 (índice alto). Como se trata de um EVTL e de um exercício acadêmico de entendimento de quais áreas computam e quais áreas não computam, não entrei em detalhes mais pormenorizados. As áreas foram tiradas por hachuras no CAD, o que pode levar a erros (“bugs” do programa).
Para Projetos de Prefeitura, chegamos nestes valores através de cálculos usando figuras geométricas simples e muita calculadora.
Eventuais erros em cálculos serão corrigidos e colocarei uma revisão indicando. Notem que não usei do Benedício de Área de Lazer R (3m² por Unidade Habitacional) em pavimento fora do térreo, portanto é bem provável que eu utilize esta área no Ático (Lazer na Cobertura). Na vida “real”, não deixamos nenhuma área sem utilização, zeramos todo e qualquer benefício.
Para uma aplicação acadêmica, é um excelente primeiro exercício.
OBS: Utilizei Unidades Habitacionais com pelo menos 30m² de área computável, não só para garantir 1 vaga por unidade mas por saber que o mercado produz unidades com essa metragem (1 dormitório).

Para citar este artigo corretamente:
SBARRA, Marcelo. Estudo de Viabilidade Técnica e Legal – Numérico (parte 8) – Dimensionamentos – Circulação Vertical, Modulação Estrutural e Estacionamento. Marcelo Sbarra, São Paulo, 18 set. 2024. Disponível em: https://marcelosbarra.com/2024/09/18/estudo-de-viabilidade-tecnica-e-legal-numerico-parte-8-dimensionamentos-circulacao-vertical-modulacao-estrutural-e-estacionamento/ Acesso em 18 de set. 2024.
Observação importante: estas informações são direcionadas a projetos acadêmicos – para projetos “da vida real” é indispensável a contratação de um Arquiteto para a verificação das necessidades de seu projeto e adequações à legislação de sua municipalidade.
© Marcelo Sbarra. Os projetos mostrados neste artigo são protegidos pela Lei de Direito Autoral (Lei 9.610/98) e Resolução 67/2013 do CAU/BR.