Dando continuidade ao Exercício Numérico que iniciamos nos posts anteriores (aqui e aqui), vamos relembrar a tabela com a qual terminamos o post anterior:

Já temos um número bastante grande de informações, além da base em DWG que vimos no primeiro post:

A primeira coisa a fazer agora é deixar o desenho com cara de desenho de arquiteto.
Definido o tamanho da folha em que vai ser apresentado, podemos colocar letras e simbologias na escala correta. Fiz um teste e para o tamanho A1, uma escala urbana boa para visualizar o lote ficou 1:200.

Dando um zoom na testada do lote, podemos ver a cota indicando que o remanescente do lote ficou com uma calçada de 5,00m em ambos os lados.

Este tipo de hachura para doação de calçada é o padrão da Prefeitura da cidade de São Paulo (PMSP).
CIRCULAÇÕES VERTICAIS E HORIZONTAIS
Antes de lançar as opções de ocupação do lote, temos que ter em mente que:
- De acordo com a IT-11 do Corpo de Bombeiros (procure aqui), prédios residenciais (R) com mais de 80m de altura precisam necessariamente de pelo menos 2 escadas de incêndio e 1 elevador de emergência.
- De acordo com a mesma IT, prédios com menos de 80m de altura, precisam de pelo menos 1 escada e nenhum elevador de emergência.
Por que o “pelo menos”? Porque para cada projeto é necessário fazer o Cálculo de População e descobrir a quantidade de Unidades de Passagem necessárias, que também nos informará o número e o tipo de escada.
Para este exemplo, estou considerando 1 escada pressurizada e altura da edificação (gabarito) menor que 80m, para a parte residencial.
3. De acordo com a IT-11, prédios não residenciais (nR) com mais de 36m de altura tem que necessariamente ter 2 escadas de incêndio, cujas portas de acesso tem que estar distantes pelo menos 10m.
Quando fazemos edifícios de Uso Misto, temos em geral 2 cenários mais adequados em termos de viabilidade financeira:
- Manter a parte nR com gabarito menor que 36m de altura, de forma a ter somente uma escada nR.
- Manter a parte R com gabarito menor que 80m de altura, de forma a evitar o custo de um elevador de emergência e de uma segunda escada R.
Dependendo do empreendimento (se dor um Triple A, por exemplo), custo não é um problema então a altura passa dos 80m tranquilamente. O que vai limitar a altura de um edifício em ZEU são duas coisas: esgotamento do CA versus recuos obrigatórios e COMAER.
O COMAER é responsável por dar diretrizes de altura máxima das edificações, em função da proximidade com aeroportos (cones de aproximação), helipontos, etc.
IMPORTANTE: Como o terreno é em ZEU, circulações verticais e horizontais são computáveis (exceção pavimento térreo e subsolos)
RÉGUA DE NÍVEIS
Antes de avançarmos sobre o tema “Afastamentos”, é importante ter em mente alguns números.
O Mercado Imobiliário trabalha com Piso-a-Piso (ou seja a distância de uma laje para a próxima laje, ou seja, o ANDAR) baseados, em geral, em múltiplos de 18 cm ou de 17,5 cm. Esses números ajudam a ter de cabeça alturas padrões que atendem a fórmula de Blondel e a IT-11 dos Bombeiros, assim como a NBR 9050 de acessibilidade.
Para espelho de 18cm, pisada de 28cm. Para espelho de 17,5cm, pisada de 29cm.
Eu costumo adotar sempre 18cm para o espelho da escada.
Desta forma, um pavimento tipo de um empreendimento “convencional” costuma ter 3,06m (17 espelhos). Normalmente o último pavimento, adotamos um espelho a mais por conta de forro e instalações prediais, ou seja, fica com 3,24m (18 espelhos).
O pavimento térreo, por se tratar do acesso ao empreendimento, contar com lojas (que precisam de pelo menos 2,50m mais mezanino) e muitas vezes ter transições de estrutura no teto é sempre mais alto. No mínimo, adota-se 5,04m (28 espelhos) sendo o ideal, para as lojas terem 2 pavimentos, 5,94m (33 espelhos).
O primeiro subsolo sempre é o subsolo mais alto, tendo em geral 3,60m (20 espelhos), devido a saida de instalações, transições estrururais, etc. o segundo subsolo em diante pode ter menos altura, entre 3,06m e 2,88m (16 espelhos).
Com base nestas informações, podemos fazer um croqui com a régua de níveis:

Neste exemplo, temos:
Pavimento térreo: 5,96m
1º ao 8º Pavimentos (nR): 3,06m
09º ao 23º Pavimentos (R): 3,06m
24º Pavimento (R): 3,24m
Ático/Cobertura: 5,50m
Como o Gabarito de altura vai do piso do Térreo ao teto do último pavimento habitável, temos uma altura total de 79,58m, portanto menor que os 80,00m dos Bombeiros.
Observe que considerei que o nR vai até o 9º pavimento pois seu gabarito de altura fica com 33,50m (menor que os 36m). Eu poderia ter adotado um térreo menor de forma a ter 10 pavimentos nR se quisesse.
AFASTAMENTOS: RECUOS FRONTAIS, LATERAIS E FUNDOS COMO CONSEQUENCIA DO NUMÉRICO
Vocês lembram da Quadro 3, onde havíamos visto que o Gabarito de altura não se aplica em ZEU. Como dito acima, não é bem assim.

Considerando o croqui acima, onde temos 24 pavimentos (Térreo + 9 pavimentos Tipo nR + 15 pavimentos Tipo R)
OPÇÃO 1 – Torre Única, sem Fachada Ativa, sem Benefício nR Incentivado, limitando o nR a menos de 36m de altura.
Considerando que as áreas computáveis são iguais, independente do pavimento ser R ou nR (uma vez que tanto circulação como área de unidade são computáveis), cheguei em uma configuração:

Observe que na planilha eu havia considerado a altura máxima conforme o croqui acima, com 24 pavimentos.
No entanto, quando preenchi até o 24º pavimento as áreas, minha área estourou o máximo de 7.200m² de computável. Fui tirando alguns pavimentos, ajustando um pouco o tamanho de laje e circulação (circulação no máximo 20% da laje, por boa prática) e cheguei exatamente em 7.200m² com a seguinte configuração:
Pavimento Térreo – nenhuma área computável
Subsolos – nenhuma área computável
do 1º ao 8º pavimento – Pavimentos nR (computáveis)
do 09º ao 16º pavimento – Pavimentos R (computáveis)
Observe que neste primeiro lançamento de números, eu não me preocupo com as áreas não computáveis. Meu objetivo é saber como consigo distribuir a área em pavimentos.
Existem infinitas possibilidades possiveis, para cada projeto. A área de circulação pode ser maior ou menor, pode ter diferenças entre circulação R e nR, a parte relativa às Unidades (sejam Apartamentos ou Escritórios) podem ser maiores ou menores, resultando em menos ou mais pavimentos.
Considerando este croqui e planilha tenho uma laje com 450m² de área computável (390 + 60) que se repete 16 vezes. Voltando ao croqui, posso dizer que o gabarito de altura até o teto do 16º pavimento é 54,92m. Somamos 18cm para o 16º ser mais alto. (= 55,10m)
De acordo com o Código de Obras e Edificações (COE), o afastamento lateral e fundos é calculado pela fórmula:
(H – 6) / 10 , onde H é o gabarito da edificação
Sendo assim, temos no nosso caso:
(55,10 – 6/)/ 10 = 49,10 / 10 = 4,91m
Afastamento Lateral e Fundos = 5,20m.
O Afastamento frontal não é necessário devido à doação de calçada; no entanto temos que verificar se a Faixa de Aeração está sendo atendida (distância da face frontal da edificação até o eixo da via)

Observe que a Torre ùnica (pintada de cinza) tem 15 x 30 = 450m², correspondendo a área do Tipo (Circulação + Unidades). Observe também que, de posse do número de pavimentos e da altura total (gabarito), consigo verificar se os 4,91m encontrados para afastamentos laterais e fundos atendem.
Neste caso, temos uma solução simples, porém correta.
No próximo post, mostrarei o cálculo mais avançado (e mais correto, pois inclui Fachada Ativa e Benefício Incentivo nR) para que vocês acompanhem a linha de raciocínio.
Para citar este artigo corretamente:
SBARRA, Marcelo. Estudo de viabilidade técnica e legal – Numérico (parte 3). Marcelo Sbarra, São Paulo, 09 set. 2024. Disponível em: https://marcelosbarra.com/2024/09/09/estudo-de-viabilidade-tecnica-e-legal-numerico-parte-2/ Acesso em 09 de set. 2024.
Observação importante: estas informações são direcionadas a projetos acadêmicos – para projetos “da vida real” é indispensável a contratação de um Arquiteto para a verificação das necessidades de seu projeto e adequações à legislação de sua municipalidade.
© Marcelo Sbarra. Os projetos mostrados neste artigo são protegidos pela Lei de Direito Autoral (Lei 9.610/98) e Resolução 67/2013 do CAU/BR.