*Este post é focado para os instrumentos disponíveis para a cidade de São Paulo*
No post anterior (aqui), falei sobre a mudança que houve recentemente ne Legislação Urbanística da cidade de São Paulo.
Agora vamos aos primeiros passos em um Estudo de Viabilidade Técnica e Legal (EVTL) e seu respectivo Numérico.
É importante entender que, para além dos aspectos de forma e inserção urbana, existem questões finenceiras muito importantes envolvidas na aquisição de um terreno (lote) ou mesmo de diversos lotes para que se faça ali um empreendimento imobiliário. A pessoa que faz este trabalho é chamada de Incorporador Imobiliário.
O primeiro item que se tem que estar atento é o Zoneamento do lote. Isto faz toda a diferença, pois é o zoneamento que ditará o Potencial Construtivo do lote e, portanto, o quanto irá ser construído versus o quanto de retorno financeiro o projeto trará.
Por isso as calorosas discussões sobre quais lotes seriam considerados como ZEU (Zona Eixo de Estruturação da Transformação Urbana), pois eles possuem o maior Coeficiente de Aproveitamento (CA) para lotes em São Paulo.
Em termos gerais, o CA máximo em ZEU é 4. Porém, se se tratar de um Projeto de EHIS ou EHMP, pode-se partir de um CA 6. Ou se o terreno estiver em Operação Urbana. Ou se incidirem sobre ele Cota de Solidariedade e outros benefícios.
Neste primeiro exemplo, vou considerar o ZEU “raiz”, ou seja, aquele cujo CA máximo é 4. Assim se inicia o chamado Numérico, ou seja, uma série de cálculos feitos com base na área do lote, no CA máximo e nos benefícios que se aplicarão no projeto, chegando-se a área construída total e a relação entre a área construída e a área privativa, privativa/terreno que irá dizer ao Incorporador o quanto vale a pena o investimento. Neste exemplo acadêmico, vou desconsiderar as questões relacionadas a finanças.
O LOTE
Quando falamos do “lote” podemos estar falando de um único lote urbano (que possui um número específico SQL – Setor-Quadra-Lote) ou podemos estar nos referindo ao lote considerado no projeto (a unificação de vários lotes em um único terreno). Esta última opção é a mais comum, visto que quanto maior o lote, mais área computável ele terá.
Primeiro passo: No Geosampa, localizar o lote (ou um dos lotes). Isto Pode ser feito de diversas maneiras, mas vamos fazer pela pesquisa de endereço.
Clicando no símbolo de “lupa”, clicamos na sequencia na aba “Endereço” e digitamos o endereço onde se localiza o lote. Clique em “Localizar” e o site trará como resultado as posssíveis ocorrências – neste caso só encontrou uma.

Clique no resultado e o mapa irá dar um zoom no lote procurado.

Aparecerá na tela um ponto azul, indicando a localização do lote procurado (está destacada em amarelo para melhor visualização).
Perceba que há um menu no lado direito da tela. O primeiro item a ser explorado é o Cadastro. Dentro dele, em Cadastro Fiscal, selecione os três primeiros itens: Setor, Quadra, Lote e teremos como resultado a imagem abaixo.

De um zoom para próximo do lote escolhido e terá a imagem abaixo:

Agora, ligue a camada Legislação Urbana – Zoneamento – Perímetro das Zonas e terá a imagem abaixo:

(Leia o post anterior sobre como ter certeza sobre o Zoneamento do lote)
A imagem já nos informa que o lote selecionado é uma ZEU, enquanto que do outro lado da rua, os lotes são ZM (Zona Mista).
Clique no ícone “i” (informações) e abrirá uma janela com o SQL do lote e a metragem quadrada dele.
OBS: Para efeitos de EVTL, usaremos a área grafada aqui (no caso 109m² – menor que o lote mínimo estipulado pela LPUOS, que é de 125m²) para os cálculos. É importante que o proprietário tenha em mãos a matrícula (documento emitido pelo Cartório) onde consta a área de Escritura (E). Quando formos fazer o Projeto Legal, a área de Escritura (E) deve ser igual á área Real (R) tomada pelo topografo no local, admitidos 5% de diferença. Para diferenças maiores que 5% é necessário fazer retificação da área no Cartório.

Agora que já sabemos como obter o Zoneamento e a área do lote, podemos dar início ao EVTL.
O TERRENO
Como dito acima, o lote possui menos que a metragem mínima estipulada pela LPUOS, ou seja, 125,00m². Para um empreendimento de médio padrão na cidade de São Paulo, utilizamos lotes que tem em média 1.500 a 2.000m².
Para efeito deste exemplo Numérico, vamos então utilizar os dois lotes marcados abaixo:

Novamente, utilizando o atalho “i”, descobrimos que o primeiro lote tem 1.200,00m² (imagem abaixo):

E o segundo lote possui 600,00m², conforme imagem abaixo:

Portanto, temos já várias informações para o numérico:
Zoneamento: ZEU
CA = 4
TO = 70% (pois o lote tem mais de 500m²)
Gabarito de altura = não se aplica (explicaremos no próximo post que não é liberado, há restrições)
Recuo de frente = não se aplica (pois há obrigatoriedade de doação de calçada)
Recuo laterais e fundos = (explicaremos no próximo post que as restrições)
Cota parte = 20
Área do lote original = 1.800m² (somando 1.200,00m² de um com 600,00m² do outro)
O CA = 4 e demais informações nós tiramos da LPUOS, Quadro 3 conforme abaixo:

Para sabermos quanto de Área Permeável devemos ter, ligamos a camada Zoneamento – Classificação Ambiental, e descobrimos ser PA 5.

No Quadro 3A da LPUOS, descobrimos que lotes em PA 5 com mais de 500m² precisam ter 25% de Área permeável o obter pontuação de Quota Ambiental de 0,37. (assunto para outro post)

Por estar em ZEU, o terreno é obrigado a ter Doação de Calçada (PDE, artigo 79, § 7º), ou seja, a calçada deverá ter a largura de 5,00m. Para isso, em geral, perde-se uma fatia na frente do terreno.

Para saber a área exata de doação de calçada:
1 – baixe o arquivo dwf via Geosampa
2 – de um offset de 5,00m da guia (calçada) para dentro do terreno
3 – desenhe a poligonal corrrespondente, coloque uma hachura e tire daía a área.
Para obter o arquivo dwf:
Clique na lupa, vá para a aba de Download de imagens/MDC e selecione o tipo “Folhas MDC/SCM 2004”. Clique em Selecionar e o cursor virará uma cruz; clique em cima do lote. Depois clique em download. (MDC = Mapa Digital da Cidade).

Aparecerá a aba a seguir; clique em download DXF.

O arquivo DXF baixado terá a seguinte aparência:

Duas coisas importantes: salve em DWG e perceba que o Norte está apontando para cima, tal qual aparece no Geosampa. Isto é importante porque você possivelmente irá precisar girar a folha e com isso o Norte também. Esteja atento.
Procurando no DWG, localize o terreno (no caso ele está no encontro de duas ruas importantes, fácil de localizar),, conforme imagem abaixo:

Congele layers desnecessários (como o quadriculado das coordenadas) e rotacione o DWG de forma que a calçada fique na horixontal, como na imagem abaixo:

Selecione a linha da guia/calçada conforme imagem abaixo e digite offset de 5,00m para dentro do terreno:

A linha amarela na imagem abaico corresponde ao offset de 5,00m. Portanto a área marcada em axul corresponde a parcela do terreno a ser doada para a Municipalidade, a título de doação de calçada.

Hora de “limpar” o desenho.

A união dos lotes pelo CAD dá uma área de 1.781,12m² e pela escritura 1.800,00m², portanto, dentro da margem de 5% de erro. Adotamos a informação oficial, 1.800,00m².
A área de doação de calçada deu, por sua vez, a área de 82,52m². Adotaremos ela.

Temos então:
Terreno original = 1.800,00m²
Doação de calçada = 82,52m²
Terreno remanescente = 1.717,48m²
Sendo assim, nossos primeiros números do Numérico:
CA = 4, portanto Potencial Construtivo = 4 x área do terreno original.
Potencial Construtivo = 7.200,00m² de área computável
Taxa de Ocupação = 70% do remanescente do lote.
TO = 1.202,24m²
Área permeável = 25% do remanescente do lote = 429,37m²
Área permeável mínima = 50% de 429,37m² (aplicando a redução de área permeável, atingindo a pontuação exigida da Quota Ambiental) = 214,69m²
Área permeável mínima = 214,69m².
Cota parte = 20 (A cota parte define o número mínimo de Unidades Habitacionais a ter no projeto e é calculada, para efeitos de EVTL, com a fórmula: Área do terreno / Cota Parte)
Cota parte = 1.800,00m² / 20 = 90 Unidades Habitacionais no mínimo). A cota parte pode chegar a 30, mas para efeitos de um primeiro cálculo de EVTL, consideramos 20.
Cota parte = 90 U.H.
Com isso, podemos partir para as primeiras opções de ocupação do lote.

Para citar este artigo corretamente:
SBARRA, Marcelo. Estudo de viabilidade técnica e legal – Numérico (parte 1). Marcelo Sbarra, São Paulo, 08 set. 2024. Disponível em: https://marcelosbarra.com/202409/08/estudo-de-viabilidade-tecnica-e-legal-introducao/. Acesso em 08 de set. 2024.
Observação importante: estas informações são direcionadas a projetos acadêmicos – para projetos “da vida real” é indispensável a contratação de um Arquiteto para a verificação das necessidades de seu projeto e adequações à legislação de sua municipalidade.
© Marcelo Sbarra. Os projetos mostrados neste artigo são protegidos pela Lei de Direito Autoral (Lei 9.610/98) e Resolução 67/2013 do CAU/BR.